quinta-feira, 29 de maio de 2008

Ser adulto é isto

A primeira vez que ele me disse esta frase estavámos a caminho do hospital com a avó R., mais pequenina e frágil do que alguma vez a tinha visto: "Ser adulto é isto, é quando passamos a ser nós a preocuparmo-nos com a nossa família, e não o contrário".
Quando somos crianças, todos nos tentam proteger da dura realidade, ocultar-nos as verdades que magoam. Somos adultos quando passamos a ser nós a proteger os outros.
Nesta perspectiva, eu tornei-me adulta aos 6 anos, na primeira vez que a minha mãe esteve hospitalizada. A partir desse dia cresci à força, sentindo-me responsável pelo meu irmão e pela minha mãe. A partir desse dia tornei-me adulta, o que não foi necessariamente bom, é um fardo muito pesado, às vezes penso que os meus pais não me conhecem, para eles eu sou sempre forte, ponderada, a vida corre-me bem e não tenho preocupações de maior. Já não me lembro há quantos anos eles não me veêm chorar. Ele diz que a culpa é minha, eu é que criei esta capa, e eu sei que ele tem razão, mas não foi para me proteger, foi para protegê-los a eles.

Hoje repeti esta frase, depois de ligar ao meu irmão, para completar o conselho familiar. Confio sempre na versão dele dos problemas lá de casa, consegue sempre fazer-me um relato mais racional (ao contrário da minha mãe, sempre tão emocional).
Estava à espera de palavras que me deixassem mais descansada. Enganei-me.
Não me quero deixar envenenar pelo tom sério e palavras cautelosas, mas tenho de ser realista, e considerar todas as hipóteses.
Mais uma vez, tenho de ser adulta.

Preocupação

Como ainda não tenho preocupações suficientes, agora tenho o meu pai doente. Doente e teimoso. Como é hábito, a minha mãe telefonou-me para fazer o relatório completo: anda há mais de um mês com uma tosse cavernosa, cansa-se imenso e está a emagrecer a olhos vistos. Esta semana sentiu-se mal no emprego, os colegas quiseram levá-lo ao hospital, mas ele recusou (nem eu esperava outra coisa dele).
A minha primeira reacção foi chamar-lhe teimoso e acusá-lo de se comportar como um puto. A minha segunda reacção foi "não vou telefonar-lhe, já não é nenhuma criança para a filha ter de andar a pedir-lhe para ir ao médico. Neste momento preciso de apoio e não o sinto e ainda tenho de apoiá-lo, estar sempre disponível".
Passados dois segundos percebi o tamanho do meu egoísmo, não é isto que eu sinto, e se não tenho mais apoio é porque não quero, porque ainda não o pedi.
Peguei no telefone e liguei-lhe, do outro lado uma voz contente de me ouvir. Fala-me do orgulho em saber que o genro vai voltar a estudar, e quando mudo o tema da conversa, o tom de voz dele também muda. Chaguei-lhe a cabeça até não poder mais, fiz chantagem psicológica, disse que não queria voltar a vê-lo no SO. Respondeu que sim a tudo e despediu-se de mim à pressa, porque ía começar a chorar. Só então me apercebi do medo dele. Só então associei a uma conversa que tivémos há cerca de dois meses, quando contei ao meu pai a situação da madrinha dele.
O meu pai tem medo de ir para o hospital e já não sair de lá.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Sem amargura

Devia ser amanhã. Foi adiada. Mais uma semana à espera.
Desta vez não estou nervosa. Ainda não comecei a ter dores de estômago, nem queda de tufos de cabelo, nem uma sensação de ansiedade constante. Talvez porque sei que fizémos tudo o que era humanamente (e clinicamente) possível até agora. Já não está nas nossas mãos.
Tenho tentado ao máximo não pensar nisto, e tenho conseguido. Continuo à procura de sinais, alerta a qualquer mudança que ainda não aconteceu, mas já não conto os dias. Já não desespero como tempo perdido. Após dois anos e meio criei defesas. Aprendi a esperar. Sem amargura.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Deslumbramento

Acabei de descobrir esta música e estou sem palavras...

Connie Talbot
"I will always love you"



P.S. - Ela tem 6 anos.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Conversas ao jantar (X)

- Então a prova correu muito bem. Eu sabia. - dito por mim com um sorriso de orelha a orelha e o mais profundo orgulho.
- Foi, agora só falta a segunda, mas não sei, não estou com vontade nenhuma...
- Porquê?
- Porque não sei programar, nunca fiz isto.
- Também não sabias fazer a página web em html, e aprendeste em 15 dias. Não tens de saber as linguagens todas, escolhe uma e vai em frente.

Após vários minutos de lavagem cerebral:
- Vou escolher Visual C++ (whatever that means)
- Porquê essa?
- Porque o Half Life foi todo feito em C++! (óbvio, como é que eu não me lembrei disso).

Na Austrália...

... é raro chover.
(E eu aqui... miséria...)

domingo, 25 de maio de 2008

Utopia?

“Não há um gesto, mesmo o mais insignificante, que não possa mudar o mundo.
Cada detalhe, cada gesto, por mais pequeno, revela uma infinidade de verdades e portanto tem uma repercussão infinita e efeitos grandiosos”

In: Le battement d'ailes du papillon

Momentos (XII)

Ser recebida com um sorriso e um abraço.
Sentar-me numa varanda com uma vista magnífica e cantos de pássaros a sobrepor-se aos sons da cidade.
Confirmar que as cores de um jardim, já antes invejado, são mais vivas e alegres que em qualquer fotografia.
Saborear caipirinhas, sabores tradicionais, conversas e risos.
Ouvir, ouvir muito, e ser ouvida também.
Desfrutar dos silêncios, sem me sentir constrangida.
Confirmar que a simpatia e boa disposição podem ser lidas e vividas.
Cultivar algo que espero sinceramente venha a dar flores, muitas flores (mesmo não sendo de courgette).
Hoje não podia esperar mais nada.
Bem hajam.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Ouvir e sentir (XIV)

Donna Maria
"Quase Perfeito"

Agitação

Acordei sobressaltada às 3 da manhã, com os sons da trovoada e da chuva a bater violentamente nas janelas, cheia de calor e cheia de sede (pois). Levantei-me de mansinho, fui descalça até à cozinha, não acendi a luz para não acordar as bichezas, encostei o nariz à janela e fiquei uns momentos a ver as gotas a escorrer pelo vidro.

Acordei sobressaltada às 5 da manhã, um pesadelo, mais um, desta vez tão estranho, estava numa casa de praia, construída no areal, com as paredes todas em vidro, por onde víamos o mar revolto pela chuva intensa que caía. A L. pede-nos conselhos jurídicos, para garantir a sua segurança, ela acredita que a mãe vai morrer de cancro, nós tentamos sossegá-la, mas em vão. A L. abre uma das portas de vidro para ir lá fora fumar um cigarro, mas a chuva e o vento são muito fortes, e ela volta, e atrás dela surgem putos, muitos putos de 10, 12 anos, com ar de rufias, e vejo um deles a tentar abrir uma das portas, e corro para trancá-la, mas ela não tranca e os putos estão a forçá-la, peço que ele me ajude, e recebo como resposta "Porque é que achas que eu te posso ajudar?" de uma forma tão seca, tão indiferente, tão ríspida que me parte o coração.
Continuo a segurar a porta, mas eles são muitos, já cercaram a casa e abriram outra porta, e começam a entrar, armados com paus. Só nessa altura ele se dá conta do perigo, mas bloqueia de medo, fica sem reacção, tenta dizer algumas palavras para acalmar os ânimos, mas não sai nada, e eu sei que estamos perdidos.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Amanhã...

... vou olhar para isto e ter vontade de apagar tudo, de certeza, mas agora, depois de um jantar regado a Pias e com um copo de Barcadi ao meu lado, é assim que vai ser: não sou perfeita. Não sou a mulher esposa dona de casa perfeita, não sou uma Bree perfeitinha e penteadinha, nem quero sê-lo, quer dizer, às vezes gostava, mas depois revolto-me com este papel que foi sempre incutido às mulheres.
Tudo isto porque acordei à 1.30 da tarde (deitei-me às 3 da manhã, se serve de atenuante) depois de senti-lo a levantar-se às 10 para ir estudar. Acordei à 1.30 da tarde e o meu primeiro pensamento foi "tenho de ir fazer o almoço para ele". O "tenho de ir" estraga logo tudo, pressupõe uma obrigação, e encarei-o como tal, uma obrigação enquanto mulher dele, que tem de tomar conta, que preencher necessidades. Ele nunca me cobrou nada, das milhentas vezes que não fiz almoço ou jantar, porque simplesmente não me apetecia, porque não gosto de cozinhar ponto. Mas sinto esta obrigação, incutida durante milhares de anos, ainda não fui capaz de me libertar dela. Se eu vivesse sozinha tenho a certeza que passava semanas a sopa e iogurtes, e era feliz assim, sem stresses. Mas com ele do meu lado não posso ser assim, porque me preocupo com o seu bem-estar, e isto não é uma obrigação, preocupo-me genuinamente, quero o melhor para ele.
Assim fiz almoço, saímos, voltámos, e chego ao final do dia a fazer um balanço, e vejo que em todo o dia não fiz nada que me desse prazer, só se aproveitou o jantar, o N. veio beber uma cerveja e ficou para comer tacos, estourámos o Pias em dois tempos, o N. foi embora e nós ficámos à mesa, eu a verbalizar as minhas mágoas, ampliadas pelo alcoól, ele a ouvir-me calmamente e a garantir-me que me aceita como eu sou.
Só falta eu própria aceitar-me como sou, não lutar contra isto.
Amanhã isto passa.

Ouvir e sentir (XIII)

Elisa Toffoli
"Una poesia anche per te"

terça-feira, 20 de maio de 2008

Momento (XI)

Chego a casa e à minha espera, em cima do tapete do rato, está uma taça com cerejas.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Manias

... Sou insuportável quando acordo, não posso ouvir ninguém, e tudo o que seja mais do que um bom dia (e de preferência sem um sorrisinho bem disposto) leva como resposta um grunhido (isto não é mania, é mau feitio mesmo)
... Todos os dias levo para o trabalho um termo com chá
... Quando encontro um blog que gosto, começo a lê-lo desde o início (incluindo os comentários). Gosto de saber como tudo começou
... Não gosto que me vejam a escrever um post
... Arranco as páginas de publicidade das revistas assim que as compro (elas ficam logo com menos 1/3 do peso)
... Quando chego a casa do trabalho, arrumo tudo o que estiver fora do sítio. Só depois sou capaz de me sentar sossegada. Cultivo a ideia que uma casa, para ser harmoniosa e transmitir paz, tem de estar arrumada
... Antes de começar a cozinhar ou a pôr a mesa para uma refeição, arrumo a loiça toda que ficou a secar do dia anterior. Só depois começo a tirar dos armários o que preciso
... Tomo banho à noite para poder ficar tempos esquecidos debaixo do chuveiro (mesmo sabendo que é um crime contra o meio ambiente). A água quente tem um poder curativo para mim
... Arranco os rótulos dos frascos dos shampoos, cremes e afins, acho que ficam muito mais bonitos (ele é que não gosta muito da ideia, de vez em quando acaba a ensaboar-se com amaciador de cabelo).

Ouvir e sentir (XII)

Karl Jenkins
"Adiemus"

Private (II)

Dor persistente, constante, que me acompanhou o dia todo, ora aguda, ora só uma moínha, mas sempre presente. Dor conhecida mas fora de tempo.

domingo, 18 de maio de 2008

Accept the good

Devia ser um lema de vida, uma palavra de ordem, devia lembrar-me disto em todas as situações, em todas as crises, em todas as inseguranças. Aceitar o lado bom é acreditar que ele existe sempre, mesmo que eu não o veja, que eu não o julgue possível. É uma outra versão do "tudo acontece por uma razão", mais prática talvez. Aceitar o lado bom não é tão fácil assim, não no momento, talvez mais tarde, analisando a questão à distância, seja possível reconhecer que o lado bom já lá estava (mas não o conseguiría ver nem que ele me desse um pontapé no cu).
Depois de ver o Things we lost in the fire (Benicio del Toro ao mais alto nível), fiquei com aquela sensação de que é possível, tem de começar por mim, ver o lado positivo e aceitá-lo (fiquei ainda com a ideia que estou a tornar-me insensível, consegui ver o filme até ao fim sem derramar uma lágrima).

Insónia

Estar acordada a esta hora, e a razão não ser o acabar de chegar da Emotions, é ligeiramente preocupante. Isto passa, eu digo sempre que isto passa, e acaba por ser verdade, mas enquanto não passa mói, dói, deixa mais uma sombra na alma. Até que o amanhã tenha mais sol, mais brilho, mais alívio.

Ouvir e sentir (XI)

Jewel
"Hands"

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Actualização

9 pares de calças que não lhe servem, incluindo umas Calvin Klein, umas Marlboro e umas Trussardi, qualquer uma delas usadas meia dúzia de vezes!!!
Ai tens de começar a fazer uma dieta, tens tens!!

Estupefacção

Estou no sofá com o portátil no colo e ele anda aqui a desfilar à minha frente, eu obriguei-o a experimentar todas as calças que tem no armário. Ainda não chegou a meio e já estão 5 pares de lado, porque não lhe servem!!
- Eu estou mais largo, não estou mais gordo.

Aprender

Gosto de viajar de comboio.
Durante 6 anos da minha vida fiz o percurso Lisboa - Entroncamento - Lisboa todos os fins de semana, religiosamente. Tinha razões para tal, tinha-o a ele à minha espera, e valeu a pena.
Com isso aprendi a fazer uma mala funcional, com tudo o que precisava, e sem pesos supérfluos (o que ainda hoje é útil, principalmente nas férias). Com isso aprendi ainda a aproveitar o tempo, hora e meia (ou mais, que naquela altura os comboios atrasavam horrores!) de estudo produtivo ou leitura fervorosa.
Mas aproveitar o tempo também pode ser (e isso eu ainda não aprendi) não fazer nada, ficar simplesmente a olhar pela janela, ver as casas e as árvores a passar, prestar atenção aos azulejos que decoram as paredes das estações, e às pessoas que esperam nas plataformas.
Hoje, na terceira ida a Lisboa esta semana, tentei pousar a revista que estava a ler e apreciar a paisagem que desfilava rapidamente pela janela. Deixei de a ver em poucos minutos, o cérebro a trabalhar a 180 à hora, pensamentos a desfilar mais depressa que a paisagem. Para conseguir excomungá-los, remetê-los à insignificância que mereciam, fui procurar ideias úteis e práticas, que pudesse pôr em prática ao chegar a casa, ideias de mudanças, muito pequenas, muito simples, mas que me deixassem com uma sensação de que FIZ algo, não fiquei parada.
Ele tem razão quando diz que tenho de aprender a ter calma.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Poema

Palavras para quê...

Maria Bethania
"Jeito estúpido de te amar"


Desfrutar

Ainda há sítios assim, que pedem para ser apreciados com calma, com tempo. Onde os passos são mais lentos, na ânsia de olhar para tanto verde, pintalgado aqui e ali com as cores garridas dos Olharapos, já um pouco estragados pelo tempo, mas que ainda sobressaem.
Onde os peixes vêm à margem buscar as migalhas que deitamos à água, às dezenas por cada bocadinho de pão, numa luta desigual onde os mais pequenos ficam sempre a perder.
Onde um piquenique à sobra de uma árvore têm um sabor mais puro, e onde uma manta na relva faz as delícias de um descanso merecido.

terça-feira, 13 de maio de 2008

O que nos faz sentir vivos

Gosto de filmes que me deixam a pensar, muito depois de terem terminado.
Hoje vimos The air i breathe, baseado num antigo provérbio chinês que diz que a vida se resume a quatro emoções fundamentais: felicidade, prazer, sofrimento e amor.
Filme muito bem conseguido, com actores excelentes e um texto que me deixou a divagar sobre o que me faz sentir viva.
The final touch: na ficha técnica do filme, as personagens principais não estão identificadas pelo seu nome, mas pela emoção que representam.
Adorei.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Bichezas

Eles também estão incluídos nos meus tropismos.
É impossível não sorrir aos ouvi-los guinchar quando nos sentem chegar a casa, ou quando começam a roer as grades da gaiola, danados por não lhes darmos logo atenção.
Fazem um vendaval de aparas de madeira e sementes (por alguma razão lhes chamam porquinhos), mas são a nossa companhia em casa, e chego a falar com eles como se fossem crianças pequenas.
O cinzento com o pêlo espetado é o Tobias, o malhado é o Crustáceo.

Som da guitarra

Foi ele que me ensinou a gostar do som da guitarra, se bem que nunca consegui atingir o estado de catarse que ele sente ao ouvir um solo do Satriani. Quando o conheci levava a guitarra para a escola e passava horas no pátio a tocar (aulas era mentira), sempre com alguém a ouvi-lo.
A primeira vez que fui a casa dele vi a guitarra eléctrica e ouvi as cassetes de Pink Floyd, Eric Clapton, Iron Maiden e Dire Straits que ele orgulhosamente me mostrava, para me incutir um pouco de cultura musical. Para ele, música sem o som de uma guitarra não estava completa, não era verdadeira.
Não sei o que aconteceu à guitarra eléctrica, a acústica veio com ele para esta casa, mas está abandonada a um canto, ele deixou de tocar, e eu tenho muita pena, porque adorava ouvi-lo.

Bruce Dickinson
"Tears Of The Dragon"
Balls to Picasso


sábado, 10 de maio de 2008

Ouvir e sentir (X)

Yann Tiersen
"La Noyee"
Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain OST

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Tropismos *

Hoje ao ler este post fiquei a pensar quais são os meus tropismos, aquilo que me faz feliz, que me arranca um sorriso. E cheguei a uma sensação, um sabor e um cheiro.
... A sensação de ser abraçada, um abraço sincero, de alguém que me seja querido, devolve-me a serenidade. Quando estou triste peço um abraço, quando estou feliz também.
... O sabor de cerejas maduras, comidas até as pontas dos dedos e os lábios ficarem tingidos de carmim, e a alma ficar saciada.
... O cheiro dos bebés, um cheiro que só eles têm e que desaparece irremediavelmente quando deixam de mamar. A primeira coisa que ele faz, quando pega num bebé ao colo, é cheirar-lhe a cabeça até à exaustão (ou até sentir o olhar incomodado da mãe da criança), porque não tem comparação, é doce sem ser enjoativo, mistura de algodão com pele macia.
... Faltou um som, que será definitivamente o som das ondas, o mais apaziguador que existe. Mas também a música, no meu caso música lamechas (algumas delas a roçar o deprimente), que me dão alguns minutos de puro alheamento da realidade, a absorção intensa dos acordes, da harmonia dos sons e da voz.

* Título descaradamente plagiado da Mesa

Exorcisar...

... uma semana demoníaca.
Foi isso que fiz hoje. Ganhei coragem e falei com o boss, disse-lhe que não ía continuar a acumular esta função que me delegaram sem sequer me consultar. Disse-o com toda a diplomacia, sem acusações evidentes (sou corajosa mas não sou parva) e julgo que ele compreendeu.
Passei o resto do tempo a pôr em dia os assuntos que já se acumulavam à 3 semanas, de uma forma ligeira, sem stress, e saí pouco depois das 5, com um último olhar de satisfação para a minha secretária arrumada.
Fui comer os melhores caracóis que conheço, na melhor companhia que conheço, e vim para casa pôr a leitura em dia, ao som de Yann Tiersen e Mazzy Star.
Os exorcismos deviam ser todos assim.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Dejá vu

Ele foi hoje a Coimbra repetir os exames.
Ter de passar por tudo outra vez, quando cheguei a sonhar que não sería necessário, ou que sería apenas uma confirmação de algo já concretizado, também contribui para as crises de choro dos últimos dias. O médico sempre nos avisou que as intervenções podiam não surtir efeito imediato, ou não resolver a situação mesmo. Mas na cave do meu coração, escondida dentro de um caixote, ainda tinha uma réstia de esperança. Tão ingénua.
Agora temos de esperar até ao final do mês para saber os resultados, numa nova consulta que pode ser a última, para o bem ou para o mal. Esperar, é só o que tenho feito nos últimos dois anos e meio, esperar por resultados de exames, esperar por consultas, esperar que Deus se lembre de mim.

Não vale a pena

Três dias do mais miserável que há, trabalhar das 8 da manhã às 8 da noite (hoje entrei no escritório às 7.40), chorar desalmadamente ao pequeno-almoço, porque não é isto que eu quero, chegar a casa tão esgotada a nível psicológico que não me apetece ver um filme, ler um livro, nem sequer falar com ele. Ver a cara de preocupação com que me olha, a dizer-me que tenho de abrandar, aprender a fazer as coisas sem pressa, não deixar que me pressionem.
Não é isto que eu quero da minha vida, sei que há pessoas que dão muito valor à realização profissional, viciados em trabalho com orgulho de ser assim. Eu não sou assim, dou muito mais valor à família, à casa onde sou feliz, aos pequenos momentos de silêncio e tranquilidade que não existem em nenhum escritório. Há coisas que o dinheiro não paga.
Por isso esta manhã tomei uma decisão: vou dizer ao boss para arranjar outra pessoa para fazer o trabalho adicional que me deram. Apesar de ter cumprido o que me tinham proposto, e de ter todas as análises prontas para a reunião de direcção, e de ter recebido uma palavra muito velada de elogio pelo trabalho realizado, não quero passar por isto tudo outra vez, o sacrifício da minha vida pessoal não tem nenhum tipo de compensação.
Simplesmente há coisas que não valem a pena.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Um dia

Andar na net à procura de oportunidades de emprego na Escócia e na Austrália diz muito sobre o diazinho de merda que tive hoje.
Não é isto que eu quero fazer o resto da vida, às vezes apetece-me largar tudo e ir embora, nem que seja para o outro lado do mundo.
Algum dia vou mesmo.

domingo, 4 de maio de 2008

Espanto

Como é possível eu não ter visto este filme antes?!
Falha gravíssima no meu histórico.

Yann Tiersen
"J'y suis jamais allé"
Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain OST

sábado, 3 de maio de 2008

Para mim

Rosas do jardim da avó.

Aguentar

A meio do almoço o assunto veio à baila, vem sempre, evito-o a todo o custo, mas eles não se esquecem. Ao princípio era só de vez em quando, mas agora é constantemente, sempre que me telefonam ou estamos juntos:
- Sabes quem esteve lá em casa esta semana? - pergunta-me ela com um sorriso meloso.
- Pela tua cara babada foi um bebé, de certeza. - respondo eu com ar de "pronto, vai começar".
- E foi mesmo, a filha do F. tão linda, tão pequeninaaaaa!!!
E eu não posso dizer nada do que quero, neste caso aprendi a ficar calada mais depressa do que nos outros, respondo meio torto, sem vontade de continuar a conversa, deixo-os ficar com a sensação que é assunto que não me interessa. Acho que eles pensam que sou eu que não quero ter filhos, é essa a mensagem que transmito, é essa a minha defesa.
Mas eles não desistem, já não é só a minha mãe, o meu pai também começa a falar nisso (a irmã dele já é avó, e o outro irmão será em breve, só falta ele) e a minha avó aproveitou a deixa "Não me deixes morrer sem um bisneto". Melodramática ao máximo.
Eu vou cortando a conversa como posso, com umas piadas pelo meio, muito evasiva, sem dar nenhuma resposta ou explicação. E o assunto acaba por morrer ali. Morrer não, fica só adormecido, à espera de uma nova oportunidade de surgir. Enquanto fôr assim aguenta-se bem, tenho medo do dia em que eles quiserem falar disso a sério, perguntar porquê. Não queria chegar a esse ponto, mentir-lhes descaradamente, inventar uma desculpa que não existe.

Família

O puto mais novo já me tinha ligado há 3 dias.
- Sabes que a mãe faz anos no sábado.
- Claro, estava a pensar em telefonar para irmos todos almoçar.
- Não, tenho outra ideia, não lhe dizes nada, reservas aí uma mesa num restaurante porreiro, nós pegamos nela e vamos ter contigo.
- Pode ser, eu vou buscar a avó L., ela vai ficar feliz da vida.
É engraçado, o puto é impulsivo e às vezes diz o que não deve, mas depois tem estes laivos de generosidade e carinho, e eu fico a pensar que o que ele quer é atenção e que gostem dele (no fundo, não é isso que todos queremos?).
E assim foi, hoje tive cá a famelga toda (mais o cão, claro, a mãe não sai de casa sem o cão!), a avó sempre a queixar-se que não compra prendas a ninguém porque não tem dinheiro, o pai a envergonhar-me à frente dele com histórias de quando éramos crianças, os putos a dizerem baboseiras e a embirrarem com o meu corte de cabelo, e a mãe feliz da vida, por ter a família toda reunida. Quando lhe dei o livro, então, foi o delírio, perante os olhares assassinos dos putos, só faltou chamarem-me traidora.
No fim do almoço, ver a cara de orgulho dela, quando viu os três filhos levantarem-se para ir pagar a conta, "os meus meninos já estão crescidos, já ganham o seu dinheiro", valeu por tudo.
Sei que pedir outros 55 anos de vida é abusar, e como ela sempre diz, devemos pedir um de cada vez. Por isso, peço a Deus que daqui a um ano volte a acontecer, todos juntos numa mesa a celebrar a vida que nos deu vida, educação, princípios, e que sempre nos deu e continua a dar amor incondicional.

Quanto tempo...

... pode durar um amor? Foi a pergunta que me ficou depois de acabar de ver este filme.
A visão magistral e as cores do Caribe de Gabriel García Marquez, os cenários de época; mas acima de tudo, a sua concepção de amor eterno e de fidelidade (?). Não me parece que vá rever o filme, achei-o um pouco parado, mas deixou-me a pensar, só por isso valeu a pena.

"A única coisa de que me arrependo ao morrer
é que não seja por amor."


Shakira
"La Despedida"
Love in Time of Cholera OST


sexta-feira, 2 de maio de 2008

Frustração

Gostava de o ajudar mas não sei como. Gostava de dizer as palavras certas na altura exacta, de lhe mostrar que é só uma fase, que vai passar, que tudo o que ele está a viver agora é uma aprendizagem, tem um propósito, mesmo que nem ele nem eu saibamos qual. "Tudo acontece por uma razão". Nem que a razão seja mostrar-lhe o quanto o amo, qual o meu limite, o que é que eu aguento ao lado dele, e tenho aguentado tudo, e pretendo continuar com todas as minhas forças. Não é porque o amor resiste a tudo, é porque eu resisto a tudo ao lado dele, gostava de ser a força que o move, como ele consegue ser para mim. Mas ele fecha-se numa concha, não consigo chegar ao seu coração e à sua alma. Porque ele não deixa entrar ninguém.
Gostava que falasse comigo, que desabafasse, mesmo que não fosse comigo, com outra pessoa, acredito que lhe faría bem, mas ele não é capaz. Infelizmente, aprendeu muito cedo a esconder os sentimentos, foi a forma que ele encontrou de se defender, de se proteger. E nunca mais esqueceu, é instintivo, não cede. E quando quebra é sozinho.
"Vais fugir", disse-lhe quando senti que procurava uma desculpa para se afastar. E ele fugiu.
Vai voltar, volta sempre, procura a minha pele para adormecer, e eu tento esquecer a frustração de não conseguir sarar-lhe as feridas da alma.

Às vezes sinto-me assim

Delta Goodrem
"Fragile"

Contra todos os meus princípios

Quando compramos uma prenda para oferecer a alguém devemos ter em conta os gostos dessa pessoa, e não os nossos. Gosto de agradar aos outros, de ver um sorriso quando abrem o presente, sabendo que vai ser usado ou admirado ou sentido.
Por isso, e contra todos os meus princípios, vou comprar o livro do Toni (Carreira) para oferecer à mãe. Tenho a vantagem de já não morar com ela, assim quando começar a narrar a vida toda do senhor ao jantar, quem ouve são os putos!!

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Conselho sábio

"Não ponhas em palavras todos os teus pensamentos" disse-me ele depois de eu ter tido uma saída infeliz, uma crítica injusta e incorrecta, numa conversa ao jantar.
Ando assim, corrosiva, as palavras saem-me a uma velocidade vertiginosa, antes de eu ter tempo de as analisar, decidir se devem ser ditas ou não. Porque há pensamentos que deviam ser só isso, ou nem isso.
Ando assim, insatisfeita e desiludida, e acabo por só ver o lado negro, penso o pior cenário para todas as situações, e o veneno sai sem controlo. E o que mais me custa é que esta não sou eu, não me reconheço nestas palavras, não gosto de ser assim.
Tenho de fazer um esforço para controlar isto, seguir o conselho dele e ser mais ponderada no que digo.

À procura de um anjo (V)

Ben Harper
"Waiting on an angel"