A minha mãe está a ficar velha. Não de idade, mas de espírito. Tornou-se rígida, perdeu a capacidade de aprender coisas novas, de agir de formas diferentes. A mais pequena mudança faz-lhe uma confusão tremenda e deixa-a sem reacção. Quase impõe uma ditadura dentro de casa, porque as coisas têm de ser feitas à maneira dela, e não permite que os outros (o meu pai e os meus irmãos, coitados) tenham uma opinião diferente.
Recusa ir passar dias à serra, quando o meu pai está de férias, para não deixar "os putos" (de quase 30 anos) sozinhos em casa "porque podem deixar a luz acesa ou a torneira aberta".
Tento abrir-lhe um pouco os horizontes, quando estou com ela, dizer-lhe que tem de ser mais flexível, que não pode ser tudo como ela quer. Mas não estou com ela tantas vezes quantas seríam necessárias para levar a mudanças.
Ela sente falta de companhia. Era a minha "função", enquanto vivia em casa dos pais, algo que eu fazia com alegria, porque a adoro, e porque podia falar com ela sobre tudo.
Tinha um espírito muito aberto. Nunca me esquecerei do dia em que saí de casa para ir morar sozinha, foi no dia de anos dela. Jantámos, cantámos os parabéns e ela disse-me "Que rica prenda de anos que me dás, vais embora de casa". Mas disse-o sem mágoa ou ressentimento, porque estava feliz por mim, por ver-me levantar voo. Já dentro do carro, vi-os à janela, e quem estava à chorar era o meu pai, enquanto ela tinha um sorriso de coragem nos lábios.
Durante mais de 20 anos nunca nos deixou ter um cão. Uma semana depois de eu sair de casa, adoptou uma cachorrinha com pêlo cor de mel, com quem fala como se fosse uma pessoa (e para quem o meu pai compra miniaturas de pastel de nata!!).
Quando me apanha no telemóvel, fala, fala, fala, porque sente falta de alguém que a ouça, tem três homens em casa, mas que não têm paciência para ouvir as histórias do voluntariado ou do chá com as amigas. Eu tenho. Mesmo quando não tenho. Porque a adoro.
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