domingo, 18 de janeiro de 2015

Agridoce

Levámos Peter Pan pela primeira vez à Serra num dos mais maravilhosos dias que me lembro de ter visto lá em cima (e foram tantos...) Calçámos-lhe as botas de borracha e soltámo-lo num manto branco macio, onde ele se enterrava até aos joelhos, aos tropeções. O riso dele encheu-me de uma sensação de alívio e de paz. Ele pouco se importou com o frio cortante da neve nas mãos molhadas, só queria agarrar bocados fofos para atirá-los ao ar, só queria andar e olhar à volta deslumbrado com tanto branco luminoso. E naqueles olhos de menino feliz vi toda a minha infância.
Regressar à Serra que será sempre tua é reviver todas as viagens que fizémos (quando ainda não havia auto-estrada e parávamos sempre no mesmo restaurante, aquele que só servia canja e frango assado), todas as queimaduras de pele que apanhei por causa do gelo (sem me importar), todas as brincadeiras com a família que só viamos nessas alturas, todo o orgulho com que nos mostravas os teus lugares preferidos, e a alegria com que voltavas sempre à tua terra, aquela que te viu nascer e que te acolhe agora, porque mesmo que nunca tenhas chegado a dizê-lo em voz alta, nós sabíamos que não havia nenhum outro lugar onde gostasses de ficar para sempre.
Voltar à tua Serra é saber de novo o que perdi há quase cinco anos, mas também lembrar-me de tudo o que me deixaste, a magia das memórias que está gravada neste manto branco que me comove de todas as vezes que o vejo. E prometo que vou passar ao teu neto esta magia, que vou nadar com ele nas lagoas no verão e empurrá-lo num trenó no inverno, que vou mostrar-lhe a tua Serra e dar-lhe momentos de felicidade que ele possa guardar e reviver com o carinho que agora sinto.














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