domingo, 13 de janeiro de 2013

Respirar de alívio

A minha sobrinha foi internada (e entubada) com 20 dias de vida. O meu sobrinho foi internado (e entubado) com um mês de vida. De todos os primos, Peter Pan até se estava a aguentar muito bem. Nem uma ida às urgências, nem uma ponta de febre, algo que eu agradecia a Deus todas as noites antes de adormecer. Mas bastou uma semana na ama, em contacto com outros meninos, para acontecer o que já era de prever. Peter Pan adoeceu. Começou a ficar rouco, depois com tosse, depois com espectoração que ele não conseguia soltar. Sexta feira fui pô-lo à ama já com o nariz muito entupido, e a meio da tarde ligou-me porque achava melhor levá-lo ao hospital. Foi o tempo de passar em casa a apanhar o saco das fraldas, e corri com ele para as urgências. Que estavam cheias de crianças. O meu amor pequenino, com uma respiração ofegante, já com febre e o oxigénio no sangue a 92%, recebeu uma senha amarela na triagem. Mesmo assim, não nos livrámos de duas horas de espera. Intermináveis. A passeá-lo pelo corredor evitando ao máximo o contacto com os outros putos, para não sair de lá pior ainda. Peter Pan muito murcho. Eu a tentar brincar com ele e mostrar-me bem disposta, para que não sentisse o meu medo. A primeira dose de aerossois foi um pesadelo, esperneou e berrou como se estivessem a espancá-lo. O oxigénio não subiu. Segunda dose de aerossois e a fita já não foi tanta. O resultado foi igual. Terceira dose de aerossois e a frase mais temida "ele vai ter de cá ficar". Pensei que quem ía precisar de oxigénio era eu. Mas passados os primeiros minutos de desânimo fiz um esforço por reagir e encarar aquilo como era realmente. O nosso filho precisava de cuidados que não lhe podíamos dar em casa. Estava no sítio certo para os receber. Pois ficamos e de cara alegre, que não o quero assustado e com medo. Subimos para a ala de Pediatria, o pai foi a casa buscar algumas roupas e as coisas básicas para eu passar a noite sentada ao lado dele no cadeirão reclinável, e deixaram-no ficar connosco algum tempo, apesar de já ser quase meia noite. Peter Pan passou a noite a receber oxigénio por um funil perto da carinha dele (felizmente não teve de ser entubado, e nem pensar em colocar-lhe a máscara, era um pesadelo, mas deve ser mal geral, porque naquela ala sabia-se sempre quando era a hora dos aerossois: era quando todos os putos começavam a gritar ao mesmo tempo...). Ontem estava a reagir bem à medicação, mas o oxigénio não subia dos 96%. Ainda não era o suficiente para ter alta. Ao almoço deram-lhe uma sopa deslavada, e um prato com arroz, cenoura cozida e coelho cozido. Ora bem, Peter Pan ainda não come sólidos, mas gosta da sopa grossa para "mastigar" (é uma delícia vê-lo comer, ele saboreia mesmo com prazer), por isso esmaguei a cenoura para dentro da sopa, e juntei-lhe o arroz (pela primeira vez), para ele não pensar que estavam a dar-lhe água por uma colher. Salvou-se a papa do lanche, que a auxiliar me deixou fazer à minha maneira, e que ficou grossa como ele gosta. Felizmente o meu gorducho não perdeu a fome, e assim que desapareceu a febre e se sentiu a respirar melhor, voltou a boa disposição, tanto que nessa tarde, depois de deixá-lo com o pai e vir a casa tomar um banho, fui encontrá-lo em estado de loucura, num palrar incessante, a espernear e a esbracejar agarrado a todos os bonecos que o pai tinha trazido. E assim continuou, eu a querer adormecê-lo à hora dos costume (8 da noite), ele a mandar-me dormir a mim, só queria conversa e esticava-se todo para trás no meu colo, a olhar para todo o lado e a cuscar todos os objectos, a tal ponto que me cansei e o deitei no berço, à espera que começasse a chorar. Qual quê, agarrou uma das mini almofadas do berço e começou uma luta sem fim, ora a mordia, ora a agarrava com os pés, ora tapava a cabeça com ela, ora a agitava furiosamente com as mãos. E sempre numa conversa imensa e com gritinhos de satisfação pelo meio. Esteve nisto mais de vinte minutos, perante o meu olhar maravilhado e o olhar divertido da mãe da cama ao lado, e da enfermeira que entrou entretanto no quarto e comentou "isso hoje está difícil, mas é natural, com a  medicação eles ficam um pouco mais excitados". Um pouco?! O meu filho está eléctrico, já são 10 da noite e ele não pára!! Lá acabou por acalmar, e assim que começou a choramingar, foi só pegar-lhe ao colo, meter-lhe a chucha na boca e vê-lo fechar os olhos, deitá-lo no berço e aconchegá-lo. Nesta noite já não precisou de oxigénio, e esta manhã o nível estava nos 100%. O pediatra vem auscultá-lo, Peter Pan torce-se todo para ver quem está atrás dele a apontar-lhe uma coisa fria às costas, "tu és esperto" mas não chora, aliás, tirando a máscara de aerosssois, as lavagens nasais e o tubo que lhe meteram no nariz para colher uma amostra de ranho (foi a única vez em que me vieram lágrimas aos olhos enquanto lá estivemos), Peter Pan foi um valente e nada o fez chorar, nem quando fez o raio-x, nem quando era auscultado ou observado ou mexido. Tivémos alta às 11 da manhã, trouxémos o nosso pequenino para casa, com indicação para ficar resguardado durante uma semana, longe da ama e dos outros meninos, e protegido de mudanças de temperatura, para ficar bem curado. Eu já sabia que mais cedo ou mais tarde isto ía acontecer, Peter Pan vai adoecer e precisar de cuidados, vai ter febre, ou vómitos, ou diarreia, ou tudo ao mesmo tempo. Faz parte. Temos de estar preparados para isto. E apesar de tudo não foi uma má experiência, fomos muito bem tratados, todo o pessoal é extremamente atencioso e afável. Mas dispenso muitos fins de semana como este...


(E mesmo a propósito, acabei de me rever neste post, excepto na questão do regime de rotatividade, por causa do leite materno. De resto a minha postura no hospital foi exactamente aquela, e sei que foi a melhor forma de ajudar o meu filho a não sentir medo ou tristeza). 

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