Eu pensava que comigo não ía acontecer. Passei os últimos dias (relativamente) bem, algum nervoso miudinho por saber que se aproximava a separação, mas sabendo que era inevitável este dia chegar, que mais valia preparar-me para isso consciente que ele ía ficar bem entregue, e que me ía custar mais a mim do que a ele. Mas não pensei que custasse tanto. Não imaginava que assim que entregasse à ama o ovo com um Peter Pan muito quieto lá dentro, a fitar-me com uns olhos muito sérios, uma parte de mim se sentisse abandonada. Dei à ama as últimas indicações e quando lhe comecei a explicar que ele agora gosta de adormecer a fazer-nos festinhas na cara e a receber beijinhos na palma da mão gorducha, quente e macia, não consegui terminar a frase. Faltou-me a voz. As lágrimas começaram a escorrer pela cara. A garganta doía do esforço de contenção. Ter de dizer a uma pessoa estranha como tomar conta do meu filho, como fazer o que até agora era uma tarefa minha e só minha, foi duro e fez-me perceber o que vou começar a perder daqui para a frente. Sei que o contacto com outras crianças lhe vai ser muito benéfico, vai estimulá-lo imenso, vai tornar-se um bebé mais independente e activo. Tenho plena confiança na pessoa que escolhemos para cuidar dele, é muito querida e vai dar-lhe muito mimo e atenção. Eu sei isso tudo. Então porque é que dói tanto deixá-lo?
(A fita foi tanta ou tão pouca que a ama me ligou passado pouco tempo, "porque partiu-me o coração vê-la assim", para me descansar que o Peter Pan estava todo contente, com os outros meninos - todos eles já andam - de volta dele a conversarem e a mostrarem-lhe os brinquedos todos).
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