segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Encher chouriços *

Gosto da nova embalagem do leite Matinal. Gosto mesmo, nunca mais tive o problema de tentar abrir os pacotes pelo picotado, com os dentes (porque raio é que dizem que aquilo é de abertura fácil? NÃO É!). E é bonita, sim senhor, e é de coisas bonitas que eu preciso de manhã, quando acordo com um humor de cão - que até nisso ando diferente, não sei se é das bagas, mas o certo é que me levanto com mais facilidade, e o humor já não é tão assassino, já se fica só pelo silencioso. Agora falta habituar-me a tomar um pequeno-almoço completo, com calma e sentada à mesa, e não engolir um copo de leite e um kiwi ou uma banana à pressa e em pé. Mas vamos com tranquilidade, que se me disciplinei a comer uma peça de fruta a meio da manhã e outra a meio da tarde, também chego lá.



E gosto de receber produtos da horta, mesmo que sejam três abóboras dentro de um saco de publicidade ao Xanax, e não sabendo o que vou fazer com aquilo tudo (a semana passada foi feijão verde, viva a sopa!!).


Gosto de teatro mas para ser sincera apanhei uma seca tremenda na peça de sábado. Salvou-me o ar de deslumbramento da mãe, que saiu da sala a soltar rasgados elogios (e com razão) à interpretação dos dois actores “realmente, é preciso ter um dom para conseguir transmitir assim tantas emoções”. E valeu pelo grande, grande Senhor Ruy de Carvalho. É uma inspiração ouvi-lo. Tão simples, tão humilde, tão apaixonado pela sua arte, por todas as artes. Disse que era "um amador profissional" porque "amo a profissão que tenho, tenho uma admiração sem limites por aqueles que praticam a minha arte (...) e tenho um respeito muito grande por quem ama, esses sim cabem no meu coração" (E depois começou a recitar Gil Vicente).

Cada vez gosto mais apaixonadamente do sorriso da E. quando me recebe com um "madiiiiinha" de braços estendidos na minha direcção. Tem uns olhos pestanudos lindos (bem que podia tê-los fotografado para o dia 14...), uns caracóis perfeitos, e fala pelos cotovelos. Sentada no sofá creme da casa nova quase a estrear, dou-lhe beijos na barriga que lhe fazem cócegas, e pasmo-me com a cara expressiva de menina feliz.

Gosto da terra da avó e por isso doeu-me o peito vê-la ontem. Pela primeira vez pisei aquela casa sem os avós lá. Só passaram duas semanas desde que eles foram para o lar, mas já parece abandonada. Os tomateiros plantados à porta em latas de tinta já estão secos, a barraquita onde faziam o lume foi deitada abaixo, o galinheiro também. “Levem o que quiserem, senão vai-se estragar tudo”. Primeiro respondi que não, não queria nada, nem sequer me apetecia lá ir, como se fôssemos desbaratar o espólio de uma vida ainda presente. Mas assim que cheguei percebi o que a avó queria dizer. Não vai tardar muito para que todo o recheio da casa se degrade. Loiças, tecidos e móveis, vão ser atacados por humidade e pó. Quisemos guardar umas recordações. Ele escolheu umas fotos antigas e um rádio pré-histórico do avô. Eu trouxe no colo um conjunto de lençóis e fronhas de linho, delicadamente bordados à mão. Não servem na nossa cama. Mas um dia, poderão servir numa cama mais pequena. E guardo a esperança de dizer baixinho “estes lençóis foi a tua bisavó que bordou”.



(a segunda foto é dele - e é ele...)

E gosto de dormir até ao meio dia e de voltar para a cama logo a seguir, de comer caracóis fora de época, do sol a jorros que entra pelas janelas e de passar o (resto do) dia de mini-calções. Gosto da cor dourada da minha pele, religiosamente mantida a custo de muito creme hidratante com autrobronzeador, para prolongar a réstia de Verão e adiar o desejo de viver num país tropical (ando a ler o Sushi Leblon desde o início, o que não ajuda nada...). Gosto deste calor "anormal" de que toda a gente se queixa, de ainda poder usar vestidos e sandálias, de dormir só com um lençol por cima, e de ter comichões nos braços só de pensar em camisolas de lã. Mesmo que os dias já não sejam tão compridos, continuam luminosos e alegres. E serenos.
É isso. Os meus dias têm sido serenos.


* Ou Não te preocupes, isto é crise de inspiração e passa (digo eu...).

4 comentários:

  1. Gosto da maneira como enches chouriços :D

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  2. Anna^, tenho de me obrigar a escrever (nem que seja baboseiras), senão isto enferruja ;))

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  3. Essa de acordar com humor de cão ofendeu-me...

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  4. Ahahahahhahah, se eu acordasse com o teu humor, era muito mais divertida :)

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